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O outro nome da vida

7 de maio de 2021

Por Marina Vidal (*)

O Sempre Um Papo segue com a programação de 2021, ano que comemora 35 anos de realização ininterrupta, realizando uma série de encontros com respeitados autores da atualidade. No dia 6 de maio, os convidados foram Aílton Krenak e Bené Fonteles para falar sobre o tema “Arte Sagrada e Espiritual de Viver”. A conversa foi mediada por Afonso Borges e contou com intérprete de Libras, sendo transmitido pelo Youtube, Facebook e Instagram do Sempre Um Papo. Esta foi mais uma edição do projeto que está acontecendo de forma virtual, devido à pandemia do Covid-19.

Ailton Krenak trouxe para a pauta a necessidade do cuidado com o próprio corpo e consigo mesmo. “Nós não estamos capazes ou equipados para cuidar de nada ao nosso redor enquanto a gente não conseguir cuidar de si. O cuidado de si é uma experiência que pode vir da própria experiência da infância”. O líder indígena também abordou sobre a natureza poética. “Na verdade, natureza é tudo, mas a experiência cognitiva, sensorial, de natureza, precisa ser despertada. E ela é despertada por um toque da nossa mãe terra. É ela que dá isso para a gente”.

Bené Fonteles acredita que tudo que move é sagrado e, no fundo, todo mundo tem os seus rituais. “Essa espiritualidade para mim é uma ética, uma forma de comportamento ético com a vida. As pedras tem uma eletricidade dentro delas, de ser, porque não é uma coisa fria. Primeiro a vida do planeta Terra foi uma formação geológica, depois surgem os vegetais, os animais. Eu fui pedra e também sou pedra com meus ossos. Isso é uma devoção muito antiga”.

O sagrado, de acordo com Krenak, está relacionado à terra. “Tem a ver com o ser terrano, filho da terra. E essa gente quer mamar na terra, rolar com ela porque a amam”. Para ele tudo que é sagrado, queremos no nosso corpo. “Sagrado é uma água limpa. É por isso que a gente não quer que sujem a água, para ela continuar sendo limpa, vida. Talvez sagrado seja o outro nome de vida, produção de vida. A relação disso com o que a gente pode chamar de espiritualidade é uma relação muito mais cultural. Em determinadas culturas, o que é sagrado está no âmbito do que é espiritual. Em outras culturas e tradições, tudo é sagrado, inclusive aqueles gestos espiritualizados, mas não tem que ser obrigatoriamente espiritual”.

Bené faz esculturas utilizando elementos da natureza que são completamente etéreas, uma vez que, pertencem a natureza e vão continuar no local. “Eu chamava de ‘ex culturas’ porque era do saber divino, da ancestralidade. Quando eu estava fazendo aquilo ali, eu estava em transe, era uma coisa que já não tinha mais um domínio. É um gesto de procurar a si mesmo, de viver autoconhecimento e de ter uma identidade profunda com aquela matéria, que é devolvida respeitosamente para o leito do rio”. Ele acredita que é preciso dialogar com os elementos da natureza e dar esse espaço para que eles se tornem sagrados. “O espaço ritualístico que a gente pode ter em todas as coisas, até em frente às câmeras e nos nossos gestos, de ter amor e gratidão pela vida”.

Provocado por Afonso Borges, Krenak discorreu sobre o conceito de humanidade. “Nós pensamos e fomos induzidos durante toda a modernidade a imaginar que estamos confluindo para um lugar que é essa humanidade. Ela é uma construção de longo tempo na história e com muita gente colaborando, ao ponto de a gente chegar no século XIX, século XX com uma clara configuração de que o mundo é habitado por uma humanidade”. A humanidade, para ele, é muito desigual, inclusive na distribuição do bem comum, funcionando de forma muito excludente. “Essa humanidade que nós imaginamos constituir, tem origem sagrada porque é a origem da vida. Todas as outras produções, subjetividades poéticas que a gente conseguir expressar podem também configurar a espiritualidade”.

Acompanhe o encontro na íntegra pelas redes sociais do projeto, no Instagram e Facebook e no canal do Sempre um Papo no Youtube, com acesso pelo link: https://www.youtube.com/watch?v=R6tSVSPR35s

FRASES:

“O sagrado evoca em você um sentimento de devoção, um sentimento de amor por aquele gesto e por aquela paisagem”. – Ailton Krenak.

“Se a gente não tivesse colaborado, todo mundo com a sua moedinha, o capitalismo não estava bombando do jeito que está”. – Ailton Krenak.

“Desde os anos 80, a gente está alertando que a água vai se tornar cada vez mais uma coisa rara porque os lençóis freáticos estão descendo em toda a terra”. – Bené Fonteles

“Nós não damos descanso para a terra, de não fazer o cultivo no mesmo lugar, e ainda usamos veneno”. – Bené Fonteles

“Temos que ter muita sabedoria para saber como vamos viver”. – Bené Fonteles

“A gente precisa compreender que mensagem a gente está recebendo desse momento mágico em que você entra em contato com os elementos da água, da terra, do fogo e do ar. Porque dialogar com esses elementos e com o espaço que se faz isso, os fazem sagrados”. – Bené Fonteles

“A gente deveria espalhar as populações para regiões onde a terra pudesse ter repouso, resguardo”. – Ailton Krenak.

(*) – Estagiária sob supervisão de Jozane Faleiro

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