Por Marina Vidal (*)
O Sempre Um Papo segue com a programação de 2021, ano que comemora 35 anos de realização ininterrupta, realizando uma série de encontros com respeitados autores da atualidade. No dia 19 de maio, o convidado foi o fotógrafo Bob Wolfenson que falou sobre o livro “Desnorte”, que reúne uma seleção de 128 fotos, incluindo retratos e registros de viagem até nus e cenas de família. A conversa foi mediada por Afonso Borges e contou com intérprete de Libras, sendo transmitido pelo Youtube, Facebook e Instagram do Sempre Um Papo. Esta foi mais uma edição do projeto que está acontecendo de forma virtual, devido à pandemia do Covid-19.
O nome “Desnorte” se deve a junção imprevisível de várias obras do fotógrafo, de conteúdos, momentos e épocas diferentes, que a princípio não seria natural, mas que, ao serem reunidas se complementam. “Em geral os fotógrafos trabalham com coisas muito temáticas e eu transito por muitas disciplinas e vertentes da fotografia. Não tinha sentido eu celebrar 50 anos se eu não colocasse esse trânsito que faço”, constatou Bob Wolfenson. Ele conta que, junto com Edu Hirama, designer e coeditor do livro, criaram textos e fizeram conexões para chegar nesse resultado que tem tanto o orgulha. “É um trabalho retrospectivo no sentido que é sobre fotos retrospectivas, mas é novo. É uma viagem nova, um trabalho novo em cima de fotos antigas”.
A dinâmica de trabalho de Wolfenson envolve a inspiração e a execução da ideia que ele classifica como impulso. Para ele, somente quando escreve um texto ou nomeia o produto, é que ele pode ser considerado como obra. “Quando fui escrever o texto, senti um pouco de desnorteio. Então, fui procurar se a palavra desnorte existia. E ela existe. Ela dá conta exatamente dessas aparentes desconexões entre as fotos e união desse desnorte que quando unidos se tornam um norte na verdade”.
O livro é livre em todo o seu percurso, não possui editora, o próprio fotógrafo produziu e bancou. “Ele tem a característica de não ser exatamente um livro. E por ser fotografia, que precisa ser vista em tamanho grande e de uma impressão maravilhosa, tivemos que correr atrás para providenciar esse formato que atendia a obra neste sentido”. Essa liberdade está muito atrelada ao estilo de Wolfenson de transitar por vários gêneros. “Meu estilo está no meu olhar, no meu jeito de ver as coisas e como isso se articula junto com as coisas que escrevo”.
O processo de seleção das fotos incorporadas no livro foi complexo. “Atualizei minhas fotografias remixando-as e contextualizando-as. Há uma lógica e uma ordem: retratos, fotos de moda, polaroides, imagens extraídas de meus livros e exposições, fotos de viagens turísticas e de viagens em busca de locações, anotações fotográficas, álbum de família e muitos nus femininos feitos para trabalhos convencionados. É um garimpo que você vai fazendo e depois o livro mesmo se apresenta”, relatou Bob Wolfenson.
O fotógrafo nunca esquematiza com os mínimos detalhes como serão as suas fotos, pois acredita que tudo é imprevisível e uma boa foto depende do momento decisivo. “O retrato é um encontro que obedece a natureza dos encontros, ou seja, tenho uma constante que é a câmera e a luz, e elas mesmas podem ser variáveis porque existem câmeras e luzes diferentes, mas existe um instrumento entre mim e o sujeito, isso é constante. O resto vou ao sabor dos acontecimentos, vou vendo como é esse encontro, se tem uma cooperação do outro comigo”.
Wolfenson não exclui a influência do fotógrafo na imagem. “Tem uma certa invasão minha para chegar aonde quero. Por mais que a minha fotografia seja ficcional, ela trabalha com elementos da realidade, mas ela é ficção porque ela é montada, é dirigida, eu faço uma intervenção na realidade”. Ele tenta ao máximo não se fechar a ideias preconcebidas. “Deixo uma luz mais ampla para que possa me movimentar e o sujeito também possa se movimentar. E eu vou rodeando-o, ele vai se rodeando. Essa é uma técnica minha que não é determinada, ela é da minha personalidade. Não é sempre a mesma técnica, eu vario as técnicas bastante”.
Apesar do sucesso de Wolfenson, a fotografia não foi uma vocação de início para ele. “Meu pai faleceu quando eu tinha 15 anos e eu quis trabalhar. O trabalho que consegui foi em um estúdio de fotografia da editora Abril. Lá, rapidamente, me desenvolvi e comecei a ter um ofício muito jovem. Eu estava fotógrafo, eu não era fotógrafo”. Bob decidiu ir para Nova Iorque para aprender mais sobre esse ramo que ele passou a se apaixonar, onde conseguiu trabalhar como assistente de um fotógrafo. “Nem no meu sonho mais delirante eu poderia imaginar que seria esse fotógrafo que sou hoje, não no sentido do sucesso, no sentido de coisas que penso, de como articulei a fotografia em mim, como me amalgamei ao meu trabalho e ele tem hoje um sentido muito maior que simplesmente um ofício”.
O livro de Wolfenson está disponível para venda pelo link da biografia no Instagram @BobWolfenson ou @EstudioBobWolfenson ou por meio da solicitação via e-mail: bobwolfensonestudio@gmail.com.
Acompanhe o encontro na íntegra pelas redes sociais do projeto, no Instagram e Facebook e no canal do Sempre um Papo no Youtube, com acesso pelo link: https://www.youtube.com/watch?v=U2RwKSlt0Ck
FRASES:
“É uma audácia minha ter pedido para o Chico Buarque tirar a camisa para fotografá-lo”. – Bob Wolfenson
“Nessa coleção de fotos tem de tudo, tem câmera grande que não se mexe de jeito nenhum, tem fotos com câmeras pequenas, tem até foto com celular”. – Bob Wolfenson
“Sou totalmente aderido à época digital. Ganhou em agilidade, em qualidade de impressão. Houve um salto muito grande”. – Bob Wolfenson
“O digital democratizou todos os processos, para o bem e para o mal”. – Bob Wolfenson
“Para você ser fotógrafo não basta você fazer fotografia”. – Bob Wolfenson
“O fotógrafo precisa ter os mesmo elementos que o escritor tem: imaginação, estilo, ideias, algum pacto com a audiência”. – Bob Wolfenson
“Não é todo mundo que fotografa que é fotografo, não é todo mundo que escreve que é escritor”. – Bob Wolfenson
“O cara que fotografa pelo celular e tem boas ideias, tem um estilo e se comunica através da fotografia, ele é fotógrafo”. – Bob Wolfenson
“Um fotógrafo profissional precisa realmente ter conexões, algum estilo, técnica e ideias”. – Bob Wolfenson
“Eu sou permeável, não tenho ideias fixas a respeito de nada. Sou permeável aos desencontros, preciso entender a ideia do sujeito também”. – Bob Wolfenson
“Minha originalidade é o fato de eu transitar por todas as coisas”. – Bob Wolfenson
“O retrato é permanente, você olha para ele, você vê uma identidade”. – Bob Wolfenson
“Têm fotos que estão no livro que não estão alinhadas com a expectativa que as pessoas têm de mim e nem eu tenho sobre mim”. – Bob Wolfenson
(*) – Estagiária sob supervisão de Jozane Faleiro