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À margem do poema

18 de agosto de 2021

Por Laura Rossetti (*)

O Sempre Um Papo de terça-feira, 17 de agosto, recebeu o escritor mineiro Ricardo Aleixo, para lançar o livro de poesia “Extraquadro”, editado pela Impressões de Minas em parceria com o Laboratório Interartes Ricardo Aleixo (LIRA). Além de comentar a obra e declamar alguns dos poemas que a compõe, o autor também falou sobre suas inspirações e sua história com a poesia. A conversa foi mediada pelo jornalista Afonso Borges, idealizador e fundador do projeto que, em 2021, comemora 35 anos de existência.

Aleixo lembra que, já aos 17 anos, ele entendeu que gostaria de ser artista durante toda a vida. Tendo nascido em uma família pobre, o autor conta que o surpreende até hoje o fato de seus pais terem acolhido e apoiado essa vontade – já que a arte, geralmente, não oferece uma segurança financeira. “O que eles tinham de afirmação minha era unicamente a frase: ‘eu prometo dedicar todos os meus dias a me aprimorar, a me qualificar e ser melhor nisso que eu escolhi, cada vez mais’”, diz Aleixo.

O autor conta ainda que, já nessa época, ele entendeu que, por ser negro, teria que se esforçar ainda mais por conquistar reconhecimento no campo da literatura. “O que eu tenho feito ao longo desses 42 anos – quase 43 – de dedicação diária à criação artística e poética, é honrar esse lugar em nome daqueles incontáveis que vieram antes de mim e não puderam expressar sua criatividade, seu talento”, completa. Aleixo afirma que luta e resiste ao racismo presente na nossa sociedade através do diálogo e da abertura ao debate; não da violência.

Toda essa dedicação, aliada ao talento, levou Ricardo Aleixo a produzir, ao longo desses anos, uma extensa obra marcada pelo uso de diversas linguagens artísticas. Ele já trabalhou, entre outros, com videopoemas, performances, peças de teatro, peças sonoras e gráficas. Para Aleixo, no entanto, sua propensão à arte expandida não é uma qualidade, mas sim uma deficiência. “Dizem assim: ‘Você é um artista completo’. Eu digo: ‘Eu sou incompleto; se eu fosse completo eu ficava em uma linguagem só!”, afirma.

A identificação e o apreço do autor pela poesia concreta parte da concepção de que, para ele, cada fonema tem sua importância na linguagem. “A ideia de um grande poema nem me interessa tanto. O que me interessa é me relacionar com o que cada fonema significa: como ele reverbera, como ele se coloca enquanto imagem, os caminhos que ele propicia”. Isto é perceptível, segundo Aleixo, no cotidiano, na língua oral, em que se nota o ritmo da fala de cada pessoa. “Poesia para mim é respiração”, conceitua.

Sobre o livro “Extraquadro”, lançado durante o bate-papo, Aleixo diz que selecionou muito dos poemas que iriam para o livro a partir da forma como as pessoas reagiram à publicação deles nas redes sociais. “Às vezes eu faço o poema no celular mesmo e já posto, sem censura nenhuma. E conforme a acolhida que esse poema tem – não necessariamente o número de likes, não estou falando de likes, mas da forma como as pessoas se posicionam em relação ao que eu publiquei –, eu me ponho a pensar ‘Isso aqui pode ir para um possível livro. É o máximo de critério que eu tenho”, conta.

O conteúdo do livro se desenvolve a partir de uma foto de infância do autor. Os poemas abordam não o que está visível na imagem, mas o que acontece no entorno e a ela se relaciona diretamente. É isto, aliás, ao que o título diz respeito: extraquadro é uma técnica da fotografia e do cinema para tratar de elementos que não fazem parte da cena. Além de “Extraquadro”, o autor vai lançar ainda este ano o “Diário da Encruza”, pela editora Organismo. Os dois reúnem poemas que Aleixo escreveu desde 2013.

Acesse a gravação da conversa, que contou com tradução simultânea em Libras, no YouTube, Instagram e Facebook do Sempre Um Papo.

* Estagiária sob a supervisão da jornalista Jozane Faleiro

Frases:

“É uma responsabilidade ética poder me definir como um poeta, como um pensador da poesia e da literatura” – Ricardo Aleixo

“A poesia, a escrita e o que me foi dado viver nesse plano da existência é uma forma de me relacionar com tudo o que há de mais elevado na vida”. – Ricardo Aleixo

“Esse gosto pela materialidade da letra, da palavra – isso me constitui” – Ricardo Aleixo

“Quando você se dedica com amor àquilo que te constitui, nada atrapalha” – Ricardo Aleixo

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